Mineiros, me perdoem, mas quem carregará o título desse texto será a banda e não o festival Pop Rock Brasil, que a teve como um dos headliners na maior edição do evento ocorrida em Belo Horizonte até então. E isso não é demérito nenhum, já que o line-up do primeiro dia foi intocável e reuniu nomes gigantes da nossa música, além, claro, do grupo que mais gosto desde o vi pela primeira vez na MTV, no início da década de 90.
E foi justamente a presença deles em show único no país que me fez mover mundos e fundos para conseguir assisti-los ao vivo. Seria a segunda (e última vez) dos caras por aqui. A primeira foi em 1994, quando abriram os shows do INXS em São Paulo e no Rio de Janeiro. E como eles haviam sido dispensados da Columbia Records recentemente, o anúncio gerou uma grande surpresa.
Quem me acompanhou nessa empreitada foi o mesmo amigo que eu quase pedi cola no Quiz MTV, quando o assunto era Cazuza. Já instalados em BH, começamos a procurar informações sobre o local onde eles ficariam hospedados. Sem muita certeza, nos jogamos pro principal hotel da capital e nos deparamos com uma simpática legião de fãs do Engenheiros do Hawaii.
Foram algumas horas de espera até que alguém nos confirmou que eles não estavam lá no momento, mas que chegariam mais tarde. Chegamos inclusive a entrar e perguntar na recepção qual o quarto onde eles estavam, mas obviamente não nos deixariam subir. Continuamos aguardando, conversando com o fã-clube, até que chega uma van e lá de dentro sai o Nenhum de Nós. Não lembro sobre o que conversamos, mas tiramos uma foto e continuamos a sabatina.
Talvez meia hora depois, outra van encosta perto da porta. E lá de dentro sai Dave Pirner, vocalista e guitarrista, com a namorada. Anos atrás, a companhia poderia até ser a atriz Winona Ryder, mas a relação dos dois não durou muito tempo. Porém, o fato é que assim que enxerguei aquele sujeito saindo do carro com um cigarro na boca, perdi boa parte dos sentidos.
Ele agradeceu o calor da recepção e percebeu a camiseta que meu amigo usava, uma verde, com o nome da banda, que eu havia lhe emprestado. Claro que eu também estava com uma peça deles, mas era preta, inspirada na capa do single ‘Misery’ e com o nome do grupo estampado apenas nas costas. E Pirner pareceu não se ater nesse detalhe.
Ofereci um cigarro pra ele, que aceitou e se juntou conosco para continuar a conversa. O problema é que eu continuava estático e não consegui falar praticamente nada com o indivíduo que há mais de 10 anos era responsável pelas músicas e melodias de que eu mais gostava.
O restante da banda chegou em outro veículo e rapidamente se aproximou, nos perguntou onde poderiam beber naquela noite e, como não conhecíamos nada por ali, falamos que poderíamos descobrir juntos. Mas nada aconteceu, eles acabaram entrando e a gente, que estava ali desde o começo da tarde, não queria correr o risco de perder o horário de abertura dos portões, marcados para o meio-dia seguinte.
Sábado, 11 de agosto. Assim que acordamos, começamos a nos preparar e seguimos para o Mineirão. Nervoso, eu sequer tomei café e lá no estádio não encontraria outra opção de consumo que não fosse cerveja. Quando chegamos, encontramos um mar de gente já na parte de fora. Procuramos o portão certo, entramos e caminhamos ao ponto mais próximo possível do palco. Agora seria só esperar um pouco mais de três horas para que fosse dada a largada.
Repetindo o que foi dito no primeiro parágrafo, a sequência de apresentações parecia ter sido escolhida a dedo. Começou com Ira!, continuou com Tihuana, Biquini Cavadão, Tianastácia, Pato Fu, Nenhum de Nós, Engenheiros do Hawaii e Charlie Brown Jr, antes da atração internacional, que foi anunciada com um Z no lugar do S.
E o show começou logo com o maior sucesso da carreira deles. Caso houvesse alguém por ali que não conseguia se lembrar do grupo, “Runaway Train” tratou de servir como um cartão de visitas. Com “Misery” e “Just Like Anyone” na sequência, eles definitivamente já tinham conquistado o público.
O repertório ainda trouxe “Without A Trace”, “Black Gold”, “Summer Of Drugs”, “I Will Still Be Laughing”, “Get On Out” e muitas outras, mas talvez o ponto alto da noite tenha sido quando um Chorão, que tinha se apresentado momentos antes, assistia tudo ao lado do palco e não se segurou quando começaram os primeiros acordes de “Somebody To Shove”. Em um momento histórico, que pouca gente tem conhecimento, já que não houve transmissão e os aparelhos celulares ainda não tinham a qualidade e resolução das câmeras de hoje, o cantor do Charlie Brown Jr invade o palco e canta a música inteira com o Soul Asylum.
Quando tudo acabou, com o som já desligado, tudo que conseguimos sentir naquele momento era a sensação de que a vida poderia zerar, que estaríamos ambos realizados.
No dia seguinte, ao voltarmos pra casa, lembro de ter pego um jornal e eventualmente abrir na página onde estava o horóscopo. Nunca havia dado muito crédito pra isso, mas quando li as primeiras linhas de meu signo, que já começava com “a sensação de dever cumprido”, nem precisei ler o resto.
Fechei o periódico, olhei pro meu amigo e ambos concordamos. “É isso mesmo”.
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